Bem formados e inovadores, especialistas noruegueses chegam ao Rio para tentar a sorte no pré-sal
São tipos esguios, louríssimos e de gestos largos que se destacam nos corredores de um dos grandes edifícios comerciais da Zona Sul carioca. Tão comuns nas praias, eles são ainda escassos nos ambientes de trabalho da cidade. Sua crescente presença no Brasil se explica por um desses raros cruzamentos do destino que juntam pessoas e interesses comuns formados a milhares de quilômetros de distância. Os personagens dessa saga são noruegueses especializados na exploração de petróleo - a maior riqueza natural da Noruega - atraídos pelas oportunidades oferecidas pelas descobertas da Petrobras em águas profundas da costa brasileira, o pré-sal. Até 2007 não havia mais do que uma dezena de empresas norueguesas baseadas em todo o país. Agora, só no Rio de Janeiro - onde 80% dessas empresas estão -, o número pulou para 120, quase metade delas enfileirada em uma única torre comercial da Zona Sul.
Os aventureiros nórdicos do pré-sal dividem-se no Rio entre aqueles dedicados à produção de petróleo propriamente dita e os que se ocupam do fornecimento de produtos e serviços de alta tecnologia. Ambos os grupos são amparados pela Innovation Norway, o braço externo do governo norueguês no Brasil, que ajuda os profissionais a se adaptar. Fora o idioma, as barreiras não são poucas. "A quantidade de tempos verbais e conjugações do português é espantosa", diz em inglês impecável o geólogo Orjan Birkeland, 52 anos, vice-presidente de exploração no Brasil da estatal norueguesa Statoil, um dos gigantes mundiais do setor. Na cartilha Como Fazer Negócios no Brasil, os noruegueses recebem conselhos sobre como se virar com a proverbial lentidão, o ardor protecionista e os labirintos burocráticos das autoridades brasileiras. Incluem-se aí, evidentemente, os entraves específicos que dizem respeito à participação de estrangeiros na indústria petrolífera brasileira. O norueguês Thomas Granli, 31 anos, que conclui um doutorado justamente sobre a aclimatação aos trópicos, traça um mesmo e recorrente diagnóstico sobre as especificidades dos contatos profissionais no Brasil. Em sua tese, ele reverbera o que já disseram antes do Brasil dezenas de outros observadores estrangeiros: "Os brasileiros se baseiam mais na confiança interpessoal do que nas instituições, têm grande apreço por hierarquia e raramente fazem críticas diretas. Um sim pode significar um não".
A primeira grande empresa norueguesa a chegar ao Rio foi a Statoil, em 2001. "O interesse dos noruegueses pelo Brasil se resumia à praia e ao Carnaval", relembra Helle Klem, 59 anos, há sete meses no cargo de cônsul-geral no Rio de Janeiro. Dados recentes mostram que praia e Carnaval estão deixando de encabeçar a lista de atrações brasileiras. Depois dos Estados Unidos, a economia brasileira passou a ser a que mais recebe dinheiro norueguês, sendo os recursos quase todos investidos no petróleo. Segundo um recente levantamento da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), só no ano passado os investimentos diretos de empresas da Noruega no Rio de Janeiro chegaram a 577 milhões de reais. Esse volume de investimentos no Rio deixa os noruegueses atrás apenas de Cingapura, cujas empresas também foram fortemente atraídas pelo pré-sal. Com uma diferença relevante. Ao contrário dos asiáticos, a maioria dos noruegueses vem para ficar - de preferência, muito bem instalados próximo à orla de Ipanema e Leblon.
A leva de nórdicos que chegaram ao Rio pertence à nata da prolífera indústria norueguesa do petróleo - que representa um quarto do PIB do país. Ainda que novatos no Brasil, os noruegueses já se destacam como fornecedores de equipamentos de alta tecnologia para a Petrobras. Produzem navios-petroleiros, radares submarinos e gigantescos guindaste usados para içar embarcações. Um animado grupo de oitenta estudantes da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia desembarcou há cerca de um mês no Rio de Janeiro. Habituados a viajar pelo mundo em busca de oportunidades, os rapazes e moças se deixam embalar pelas atrações mais típicas, as ondas e o banho de sol que lhes marca a pele tão alva que nenhum filtro ultravioleta consegue proteger convenientemente. Eles dão sua contribuição própria à rica lista de esquisitices da orla equilibrando-se com destreza sobre os esquis de rodinhas, nostálgica solução dos aventureiros globais noruegueses em regiões sem neve e que se popularizou - na própria Noruega no curto verão. Diz o estudante de engenharia naval Erlend Bergsronning, 24 anos, mais um norueguês que acredita ter vindo para o Rio de Janeiro para ficar: "Para mim é muito boa a sensação de estar em um lugar desconhecido com tantas coisas ainda por desbravar". Que diria dele o famoso Peer Gynt, herói da peça do norueguês Henrik Ibsen (1828-1906), que, julgado perdido no mundo, vivia na "fé, na esperança e no amor" da mãe?
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