Desde que as primeiras descobertas do pré-sal foram anunciadas, o setor de petróleo no Brasil foi tomado por uma onda de investimentos bilionários, movimentando uma enorme cadeia produtiva de negócios e impulsionando a busca de novas tecnologias. A Petrobras é a mola propulsora do processo. Seu plano de negócios para 2011-2015 prevê aportes de US$ 117,7 bilhões em exploração e produção (E&P) no Brasil, dos quais US$ 53,4 bilhões para o pré-sal.
No plano anterior, de 2010-2014, os recursos destinados à área eram de US$ 33 bilhões. Entre os novos números, há US$ 12,4 bilhões para desenvolver a cessão onerosa - áreas de exploração concedidas no pré-sal da Bacia de Santos para a Petrobras, pela União. "O pré-sal tem potencial para alavancar a economia brasileira e colocá-la entre as cinco maiores do mundo", aposta Roberto Simonard, especialista em economia internacional e comércio exterior da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), do Rio de Janeiro.
Simonard ressalva: esse futuro promissor depende do comportamento da economia do carbono e do enfrentamento de desafios tecnológicos e financeiros, já que serão necessários cerca US$ 300 bilhões para investimentos. A presença das petroleiras estrangeiras é importante, tanto para financiamento como para a tecnologia. Com a crise econômica nos países desenvolvidos, Simonard acha que pode haver dificuldade em levantar recursos, sobretudo nos próximos três anos. "Não acredito em desistência das empresas internacionais, mas os projetos podem atrasar".
Segundo o Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), as petroleiras estrangeiras e nacionais de menor porte pretendem investir cerca de US$ 30 bilhões em E&P - parte para o pré-sal - entre 2011 e 2015. Algumas chegam com sede ao pote. É o caso da chinesa Sinopec, que adquiriu 40% da Repsol, dando origem à Repsol Sinopec e neste ano comprou 30% da portuguesa Galp - o que a coloca como grande parceira da Petrobras, com participação em áreas do pré-sal na Bacia de Santos, o filé do novo negócio. A Sinopec é também forte candidata a adquirir ativos que a britânica BG vai vender na Bacia de Santos.
Em meio a essa dança de cadeiras, ocorrem novos achados. No fim de novembro, a Petrobras encontrou óleo de boa qualidade em um poço localizado no bloco BM-S-8, em águas ultraprofundas do pré-sal da Bacia de Santos, a 270 km do litoral paulista.
A atividade do pré-sal em áreas já licitadas rende, segundo dados de novembro da Petrobras, 87 mil barris diários na Bacia de Campos e outros 91 mil barris diários na Bacia de Santos, em função dos testes de longa duração (TLD). Até outubro, informa a Petrobras, 34 poços foram perfurados na Bacia de Santos, 27 deles exploratórios. A perspectiva é fechar 2011 com mais cinco poços perfurados. Na área, há dez sondas em operação e a previsão é dobrar esse número até o final de 2012. A participação do petróleo do pré-sal na produção nacional da Petrobras em 2011 fica em cerca de 2%. Mas a empresa quer elevar essa fatia para 18% em 2015 e 40,5% em 2020, quando prevê uma produção de 4,9 milhões de barris diários no país.
Dados do governo mostram que as estimativas de reservas para o pré-sal indicam potencial de 70 bilhões a 100 bilhões de barris de óleo equivalente (boe, somatório de petróleo e gás natural). As reservas conhecidas de petróleo da Petrobras atingiram 16 bilhões de boe em 2010. Pouco mais de 30% das áreas do pré-sal estão sob concessão. O restante será negociado em novos leilões.
As primeiras rodadas de licitação de áreas do pré-sal, já incluídas no novo marco regulatório - o regime de partilha - dependem da votação da lei dos royalties, que colocou os Estados em pé de guerra no Congresso Nacional. "Para marcar o primeiro leilão, é preciso definir como ficará a questão dos royalties", lembra a sócia diretora da MB Associados, Tereza Fernandez. Para ela, a participação com maior ou menor apetite das petroleiras multinacionais vai depender da oportunidade de ganhos, resumida na velha equação custo-benefício. "Mas em um momento de crise mais grave, com crédito mais difícil e caro, os planos podem ser afetados", avalia.
Para o analista de petróleo da consultoria Tendências Walter de Vitto, os grandes gargalos para uma arrancada do pré-sal são a indefinição política sobre os royalties, para fechar o arcabouço regulatório, e o fato de a Petrobras ser operadora única e com participação mínima de 30% nos blocos do pré-sal no novo marco regulatório. A primeira área a ser licitada sob o novo modelo deve ser o reservatório Libra, na Bacia de Santos.
A demora em licitar os blocos do pré-sal no regime de partilha não trará grandes danos, diz Simonard, da ESPM. Ao contrário. Ganha-se tempo para a situação econômica nos Estados Unidos e Europa dar sinais de melhora. "Na atual conjuntura, acredito que muitos investidores vão optar por não participar, mesmo aqueles que têm um alto interesse na área petrolífera." De qualquer forma, o novo eldorado brasileiro é lugar certo para as empresas petroleiras fincarem suas bandeiras. "O pré-sal é uma das últimas fronteiras petrolíferas, é onde as empresas exploradoras e produtoras querem estar", observa o analista-chefe da corretora Socopa, Osmar Camilo.
Demanda vai somar US$ 224 bi
A demanda da Petrobras, estimada em US$ 224,7 bilhões até 2015 em seu atual Plano de Negócios, tem o potencial de desenvolver uma cadeia de fornecedores de bens e serviços produtiva e competitiva no Brasil. Para garantir a execução dos mais de 700 projetos que possui em carteira no prazo e com custos competitivos, a Petrobras a vem implantando uma série de ações com fornecedores nos últimos anos. Um levantamento feito pela Organização Nacional da Indústria do Petróleo (Onip) mostra que as atividades de exploração e produção de petróleo (E&P) devem gerar uma demanda de US$ 400 bilhões em contratações até 2020.Lastreada pela demanda gerada pelo pré-sal, a Petrobras necessitará de nada menos do que 54 sistemas de produção, 146 barcos de apoio, 40 novas sondas de perfuração, entre outros equipamentos, até o final da década. Isso sem falar nos navios petroleiros já encomendados pela Transpetro e pela Área de Abastecimento da própria estatal, que somam até o momento 88 embarcações.O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, admite que a capacidade da indústria de fornecer bens e serviços à estatal será o termômetro da exploração do pré-sal. O executivo vem sucessivamente se reunindo com empresários e sugerindo a ampliação do leque de atuação das empresas.
"Temos gigantescas oportunidades de compra, sabemos como fazer, temos tecnologia. Cabe a vocês tomar decisões e se tornarem nossos parceiros", disse Gabrielli durante encontro com cerca de 300 empresários no Espírito Santo. Um diagnóstico feito pela própria empresa indicou três entraves à expansão sustentável da cadeira de suprimento. Acesso a tecnologia, qualificação de mão de obra e fontes de crédito para investimentos e a obtenção de capital de giro.
Para resolver o último problema, a Petrobras lançou em junho o programa Progredir, que pretende criar um ambiente favorável para a concessão de crédito a fortalecedores e ampliar a cadeia produtiva no país. O programa foi desenvolvido em conjunto com Banco do Brasil, Bradesco, Caixa Econômica Federal, Itaú, HSBC e Santander e com o Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural (Prominp).
A expectativa da petrolífera é que o Progredir atinja a marca de R$ 1 bilhão em financiamentos liberados ainda em 2011. As ações pretendem ampliar a participação do conteúdo local nos projetos. Hoje a Petrobras tem uma média de nacionalização de projetos de E&P variando entre 65% e 85%. Alberto Machado, diretor de Óleo e Gás da Abimaq, cobra, porém das petrolíferas, um detalhamento maior de sua demanda futura e também a garantia de contratação de demanda anunciada no prazo estabelecido. "Se você se prepara para uma coisa que vai acontecer em cinco anos e isso acontece em dez anos, você quebra", diz.
Exploração ainda gera incertezas
Aprovado no fim de 2010 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o marco regulatório de exploração e produção nas áreas ainda não concedidas que integram a camada pré-sal ainda espera seu teste de fogo. Há muita expectativa sobre quando o governo irá anunciar o primeiro leilão sob o novo modelo, mas nenhum prazo foi definido. A nova lei, aprovada no Congresso Nacional no início de dezembro, estabelece que o atual modelo de concessão para a exploração de petróleo será substituído pelo mecanismo de partilha da produção. Por esse sistema, as empresas responsáveis pela exploração terão que repassar para a União parte do petróleo extraído.A lei ainda determina que a Petrobras seja a operadora única de todos os campos de exploração do pré-sal, com participação de 30% nos consórcios que forem formados. Também criou a Pré-Sal Petróleo S.A, empresa estatal que vai coordenar os trabalhos de exploração do petróleo. "Não há nenhuma indicação do governo de quando serão feitas as concessões no pré-sal e não se sabe quando ocorrerá a licitação para a camada pós-sal, que ficou no vácuo", afirma Paulo Cesar Ribeiro Lima, consultor legislativo da Câmara dos Deputados.
Outro ponto ainda não resolvido é a distribuição dos royalties, que está sendo discutida na Câmara. "Há indicações de que governo pretende primeiro resolver o imbróglio e depois fazer as concessões, que seriam primeiro voltadas para a camada pós-sal", afirma um consultor que presta assessoria a empresas privadas de exploração de petróleo. Esse cenário traz preocupações para a indústria que considera incerta a retomada das concessões e teme que a discussão na Câmara possa terminar apenas no Supremo. De 2009 para cá houve uma redução da área sob concessão, de 341 mil km2 para 114,3 mil km2.
"A exploração da camada pré-sal no regime de partilha ainda é uma questão virtual porque não há indústria nacional hoje capaz de atender ao conteúdo nacional dessas novas áreas", diz Ribeiro Lima. A nova legislação também estabelece a criação do Fundo Social, cujos recursos serão obtidos pelo governo com a exploração do pré-sal e com a venda do petróleo que receberá das empresas exploradoras.
O objetivo é investir esse dinheiro em programas e projetos nas áreas de combate à pobreza e educação, cultura, esporte, saúde pública, ciência e tecnologia, meio ambiente e na mitigação dos efeitos das mudanças climáticas, mas não há percentual definido de aplicação em cada área. "Mas esse fundo vai demorar para existir porque as concessões sob o regime de partilha ainda levarão muito tempo para decolar, e há riscos", diz Ribeiro Lima.
Segundo especialistas, o grande desafio é viabilizar os leilões para as áreas do pré-sal com os novos contratos de partilha da produção. Além das pressões políticas pela criação de mais uma empresas estatal, há tarefas que demandam tempo e podem levar a questionamentos dos participantes, principalmente porque falta histórico para concessões desse tipo. Um dos pontos é a própria licitação, que exigirá a elaboração do contrato de partilha de produção para depois submetê-lo à consulta pública e selecionar as áreas que serão ofertadas. As licitações das áreas no pós-sal utilizam o bônus de assinatura como principal critério de seleção dos vencedores. Já no pré-sal o governo fixa o valor do bônus de assinatura e a partilha de produção é utilizada como principal critério de seleção das empresas. O risco, segundo os especialistas, é o governo estabelecer um valor de bônus de assinatura juntamente com um valor mínimo de partilha que sejam inviáveis para a Petrobras e as empresas associadas.
Ano eleitoral acirra debate sobre royalties
A votação sobre a redistribuição de royalties sobre a produção de petróleo e gás entre União, Estados e municípios deverá ficar para o primeiro semestre de 2012, ano em que as cerca de 5.600 cidades brasileiras terão eleições para prefeitos, o que poderá tornar a discussão do projeto mais acirrada. Restará ao governo federal tentar apaziguar os ânimos entre as bancadas do Rio de Janeiro e Espírito Santo, os dois maiores produtores, e as dos Estados não produtores. Todos estão de olho nas receitas e produções futuras: estima-se que a distribuição de royalties e participações especiais possa pular de R$ 22 bilhões para cerca de R$ 40 bilhões até o fim da década.Destravar a queda de braço não será fácil. Por um lado, a Frente Municipalista Brasileira entregou um requerimento no fim de novembro, com 288 assinaturas de deputados, pedindo urgência na votação do projeto. De outro, parlamentares fluminenses e capixabas ingressaram no Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir que a Câmara delibere sobre o projeto de lei do senador Vital do Rego (PMDB-PR). A proposta foi aprovada pelo Senado em outubro e agora tramita na Câmara dos Deputados como projeto de lei 2.565/11. A argumentação dos parlamentares do Espírito Santo e Rio de Janeiro é que a proposta é inconstitucional porque causa eventual mudança na forma de rateio das participações, o que levaria a uma grave crise federativa, com cisão e confronto hostil entre os estados produtores e os não-produtores.
"Acredito na votação do projeto de lei na Câmara no primeiro semestre de 2012", afirma o deputado federal Zeca Dirceu (PT-PR). Para Dirceu, Rio de Janeiro e Espírito Santo radicalizaram ao apelar para o Supremo Tribunal Federal (STF). Os municípios levantaram a guarda e discutem mexer nos royalties de áreas já concedidas e não apenas em poços futuros. "Na minha avaliação, o projeto só teria de vislumbrar os royalties de áreas concedidas no futuro", afirma o deputado.
O advogado Rodrigo Bornholdt, do Bornholdt Advogados, acredita que só uma posição mais ponderada das duas partes poderá resultar em avanços na negociação. "O projeto envolve interesses divergentes e o resultado é difícil de ser mensurado", analisa.
Para Bornholdt, como a proposta atinge os atuais contratos, abre espaço para contestação, já que poderá ter grande impacto sobre as receitas de grandes produtores. "O maior problema não é a divisão futura dos royalties. Preocupante, em termos de segurança jurídica e do equilíbrio federativo, é a tentativa de alteração dos percentuais relativos aos royalties dos poços em exploração e dos contratos firmados."
O projeto altera a forma de distribuição dos royalties, que passarão a ser recebidos também por estados e municípios não produtores. A proposta será analisada por uma comissão especial da Câmara - ainda não constituída -para ir à votação no plenário. Para o advogado, o impasse poderia ser resolvido se o assunto ganhasse uma proposta mais ponderada, sem uma diminuição drástica para os estados produtores nas áreas já concedidas e com a transferência de maiores alterações para as áreas do pré-sal a serem concedidas sob o regime de partilha, criado com o marco regulatório estabelecido em 2010.
A batalha política não é a única polêmica. O setor de ciência e tecnologia está preocupado. "Não está se fala em como usar esses recursos para melhorar o país", diz Helena Nader, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Uma preocupação do segmento é que o projeto aprovado no Senado não prevê receita para o fundo setorial de petróleo, criado em 1997. "Com o projeto atual, o fundo CT Petro é eliminado, e isso é um contrassenso. Sem pesquisa e inovação, a camada pré-sal não teria sido descoberta", diz Helena. A verba desse fundo, estimada em cerca de R$ 1 bilhão, é aplicada na qualificação de pessoal e em projetos de pesquisas em parceria com empresas, universidades e centros de pesquisa.
O projeto diz que os recursos do Fundo Social irão para áreas como saúde, educação, tratamento e reinserção de dependentes químicos, meio ambiente, cultura,, entre outras. Não foi definido o percentual a ser aplicado em cada segmento. A proposta dos acadêmicos é que sejam destinados 7% dos royalties do petróleo extraído em terra ou em mar que caberiam à União para ciência, tecnologia e inovação, e outros 7% para educação. No caso dos recursos destinados aos Estados e municípios, a entidade defende que sejam aplicados 30% em ciência, tecnologia, inovação e educação. "O Brasil precisa discutir como usar esses recursos para criar políticas de Estado para melhorar o país", diz Helena.
O projeto de lei determina a redução de 50% para 42% da parcela da União na chamada participação especial - tributo pago pelas empresas na exploração de grandes campos, principalmente os recém-descobertos no pré-sal. Em relação aos royalties, traz uma redução de 30% para 20% na fatia destinada ao governo. O relatório também traz perdas para os estados produtores, que terão a parcela reduzida de 26,25% para 20%. A participação especial destinada aos produtores, segundo o relatório, cai de 40% para 20%. Um dos artigos mais polêmicos determina que, sob o regime de partilha de produção, os royalties serão pagos da seguinte forma: estados e municípios produtores receberão 20% e 10% respectivamente; 5% irão para as cidades afetadas por operações de embarque e desembarque dos produtos; 25% para constituir um fundo dos estados e do DF; 25% para um fundo dos municípios; e 15% para um fundo social.
ANP deve impor regras mais rígidas
O acidente no campo de Frade, na bacia de Campos, operado pela empresa americana Chevron, que provocou o derramamento de 2,4 mil barris de petróleo, em novembro, pode levar a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) a impor novas regras às empresas que queiram perfurar poços exploratórios em áreas já em produção, visando atingir horizontes de profundidade como o pré-sal. Procurada pelo Valor, a ANP não confirma a informação, mas, segundo fontes que preferem não se identificar, há em curso um estudo para aumentar exigências para concessão de autorização de perfuração nessas áreas.Uma dessas medidas seria obrigar as petroleiras a construir um revestimento interno até o topo dos reservatórios. Um indicativo de que a ANP busca mais rigor envolveu a própria Chevron: a agência não autorizou a petroleira a perfurar um novo poço no campo de Frade, também para atingir o pré-sal, cuja faixa se estende entre o litoral dos Estados do Espírito Santo e de Santa Catarina, numa área de cerca de 800 km2. Em nota à imprensa, a agência explicou que a nova perfuração implicaria riscos idênticos aos que originaram o vazamento. A ANP justificou a decisão com base em análises e observações técnicas "que evidenciam negligência por parte da concessionária na apuração de dado fundamental para a perfuração de poços e na elaboração e execução de cronograma de abandono, além de falta de maior atenção às melhores práticas da indústria."
A Petrobras seria a mais atingida caso estas normas entrem em vigor. O Programa Varredura, coordenado pela Área de E&P da empresa, que visa identificar novos reservatórios em áreas já em produção, identificou 284 prospectos exploratórios nas bacias de Campos e no Espírito Santo, com volume recuperável estimado em 2,235 bilhões de barris de óleo.
"Acidentes de proporções menores serão incluídos no plano", diz o secretário Martins Almeida
No último ano, a Petrobras interligou cerca de 30 poços produtores em mais de dez campos, entre eles Marlim, Roncador, Piranema e Caratinga. As novas descobertas estão no pós-sal e no pré-sal, na bacia de Campos. Os poços representaram um acréscimo de 50 mil bpd à produção.
Para o consultor em Energia e sócio do Centro Brasileiro de Infraestrutura, Adriano Pires, o que é preciso é uma fiscalização melhor. "O governo deveria, primeiro, capacitar órgãos como a ANP e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para exercerem a atividade de forma adequada", diz.
De 2008 a 2011, a ANP gastou R$ 75,5 milhões na fiscalização das atividades do upstream (exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás), o que representa 90,92% do total previsto nos orçamentos do período. Neste ano, empenhou R$ 13,9 milhões até 30 de novembro para a função - 94% do orçamento do ano.
Pelo acidente em Frade, a Chevron foi multada em R$ 150 milhões: R$ 100 milhões da ANP, por não cumprir o Plano de Abandono de Poço e pela adulteração de informações sobre o monitoramento no fundo do mar; e R$ 50 milhões do Ibama. E o Ministério Público Federal em Campos (RJ) entrou com ação civil pública contra a empresa pedindo indenização de R$ 20 bilhões por danos sociais e ambientais e pediu à Justiça Federal que conceda liminar suspendendo todas as atividades da Chevron Brasil e Transocean, sob pena de multa diária de R$ 500 milhões.
Quanto ao Plano Nacional de Contingência, em elaboração há dez anos, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, informa que foi formada comissão interministerial para revisar os estudos. "Temos que ter um plano que, de fato, corresponda às nossas necessidades e que funcione. Temos agora o pré-sal, coisa que não havia antes", destaca Lobão. O secretário de Petróleo, Gás Natural e Combustíveis Renováveis do Ministério de Minas e Energia, Marco Antônio Martins Almeida, explica que os ajustes são necessários para que o plano contemple, por exemplo, a atuação do governo em derramamentos de pequeno porte. "O plano foi construído para acidentes de grandes proporções. Agora, acidentes de proporções menores devem ser incluídos", afirmou Almeida, em audiência pública na Câmara dos Deputados.
Para o diretor de Tecnologia e Inovação da Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe), Segen Esteffen, o país já tem condições de ter um plano eficaz. "Temos recursos humanos, laboratórios de ponta e a Coppe tem toda a disposição para contribuir com o governo e agências reguladoras. A ideia é criar uma comissão independente que planeje os passos para a construção de uma estrutura técnica forte, que eventualmente deve ser na própria ANP, e que enfrente com maior segurança esse tipo de acidente", aponta Esteffen.
Hoje é a Petrobras quem elabora programas de contingência para cada uma das plataformas, mas o governo quer uma estratégia em nível nacional, com a atuação conjunta dos órgãos fiscalizadores e do meio ambiente.
Outra consequência do vazamento do campo de Frade pode ser o adiamento da oferta de novas áreas exploratórias. A 11ª rodada de licitações da ANP havia sido adiada para 2012, sob o argumento de se resolver a questão dos royalties. Agora, o temor é que o vazamento leve o governo a adiar mais a oferta de áreas offshore - a última rodada foi em 2008.
Estatal para gerenciar reservas ainda não saiu do papel
Inspirada em parte na Petoro, estatal norueguesa responsável pelo gerenciamento do portfólio de reservas de petróleo e gás do país, a Empresa Brasileira de Administração de Petróleo e Gás Natural S.A - Pré-Sal Petróleo S.A (PPSA) teve sua lei de criação sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em agosto de 2010.Desde então, nada andou. A PPSA será vinculada ao Ministério das Minas e Energia (MME). Para se concretizar, depende ainda da assinatura de um decreto presidencial definindo estatuto e estrutura. A lei determina que a sede e foro estarão em Brasília e haverá um escritório central no Rio de Janeiro.
O papel fundamental da nova estatal será avaliar técnica e economicamente os planos de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural, e gerenciar os contratos. Também estarão a cargo da PPSA as tarefas de monitorar e auditar a execução de projetos e operações, custos, investimentos e preços de venda, negociar contratos e verificar o cumprimento da política de comercialização.
A PPSA não terá, porém, responsabilidade pela execução, direta ou indireta, das atividades de exploração, desenvolvimento, produção e comercialização de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos.
A direção terá à frente um conselho de administração e uma diretoria executiva, com integrantes nomeados pelo presidente da República, entre os indicados pelos ministérios das Minas e Energia, Fazenda, Planejamento, Casa Civil da Presidência e ainda o diretor-presidente da empresa.
"Eventuais ingerências políticas são inevitáveis no Brasil. E elas já começaram, conforme demonstra o debate sobre a divisão dos royalties no Congresso Nacional", observa Roberto Simonard, especialista em economia internacional e comércio exterior da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), do Rio de Janeiro. "Nossa tradição na criação de estatais não é boa, gera empreguismo e custos. Não havia necessidade de mais uma estatal. A solução para gerenciar os contratos da partilha no pré-sal poderia ser um departamento dentro do Ministério das Minas e Energia", diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).
Setor precisa investir na formação de técnicos
O apagão de mão de obra é um desafio ao pré-sal. Centenas de cursos superiores foram criados nos últimos anos nas universidades, mas a carência maior é de pessoas que concluam o ensino técnico. Algumas expectativas para o futuro do setor dão uma ideia das dificuldades para a capacitação de pessoal. Em uma década devem ser criadas quase seis vezes mais vagas do que o contingente hoje absorvido pelo setor.
O Programa de Mobilização da Indústria do Petróleo (Prominp) diagnosticou uma demanda de 265 mil trabalhadores qualificados para a área de óleo e gás até 2020 - 66% em ocupações operacionais. O número é quase três vezes e meia os 79.170 que já foram qualificados em todo o país nos últimos quatro anos.
Um cenário para daqui a três anos foi apresentado no 8º Encontro Nacional do Prominp realizado no fim de novembro em São Luís, no Maranhão. Ele prevê, com base no Plano de Negócios da Petrobras 2010/2014, a abertura de vagas de trabalho em 40 sondas, 281 embarcações de apoio e plataformas, nos estaleiros que constroem os navios da frota de petroleiros da Transpetro, em quatro novas refinarias e nos complexos petroquímicos de Suape (PE) e do Rio.
Um estudo da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), em parceria com a Organização Nacional da Indústria de Petróleo (Onip), estima que a cadeia produtiva de óleo e gás é responsável por 420 mil empregos formais diretos e indiretos no Brasil. O número pode chegar a 2,5 milhões de empregos caso seja implantada uma agenda de competitividade: da inserção da indústria no processo de inovação à melhoria das condições de infraestrutura e transporte, passando pela disseminação do conhecimento, ampliação da educação técnica e superior e reforço da educação básica.
"Hoje, o apagão de mão de obra para o pré-sal é consequência das falhas da formação básica", diz Alexandre dos Reis, diretor de Relações com o Mercado do sistema Firjan, que reúne Sesi, Senai e Senac. "Há baixa quantidade de gente capacitada para ingressar no ensino médio em condições de se formar técnico."
Só o Senai é responsável pela capacitação de 52,78% dos formados pelo Prominp em todo o país. As maiores carências de pessoal se concentram em logística, indústria naval e automação. Nos últimos três anos, os investimentos do sistema para atender a demanda por capacitação chegaram a R$ 180 milhões em novas unidades e equipamentos de última geração, como o simulador de treino em navio plataforma.
"As empresas tentam fazer a sua parte, mas o mundo corporativo brasileiro ainda investe duas a três vezes menos em treinamento do que em países desenvolvidos", afirma Alexandre dos Reis, da Firjan. "As empresas ainda tratam investimento em treinamento como despesa e preferem pegar funcionários das concorrentes a capacitar seus próprios empregados."
Um programa da Agência Nacional de Petróleo (ANP) reúne hoje mais de 30 universidades brasileiras capacitadas para a formação de mão de obra. É o caso da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que vai oferecer no ano que vem um MBA em Gestão de Empreendimentos de Construção Naval e Offshore no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Oceânica, que atua em áreas críticas para o desenvolvimento do pré-sal.
"Todas as universidades tiveram que acelerar os processos de renovação dos currículos com o pré-sal", diz Luiz Landau, professor de Engenharia Civil da Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ).
Finep lançará novos editais para inovação em 2012
A Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), empresa vinculada ao Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), prepara a realização de novas chamadas públicas para projetos de inovação tecnológica para a nova fronteira exploratória do pré-sal. A ideia é que os novos editais, que já estão sendo discutidos no ministério, sejam lançadas no próximo ano.Os concursos da Finep vêm no rastro de uma bem sucedida chamada pública lançada em 2009 e concluída no fim de novembro. Ao tudo, a empresa selecionou 58 dos 300 projetos de inovação com foco no desenvolvimento do pré-sal, nos quais serão aplicados R$ 115,7 milhões. Na primeira filtragem, 254 projetos foram classificados.
A chamada pública priorizou os segmentos de válvulas, conexões/flanges, umbilicais submarinos, calderaria, construção naval e instrumentação e automação. Um comitê com representantes da Finep, da Agência Nacional do Petróleo e pesquisadores foi responsável pela escolha dos projetos, que foram classificados pela sua relevância.
Os recursos, que variam entre R$ 1 milhão a R$ 8 milhões por empresa, serão repassados às instituições de pesquisa indicadas como parceiras dos fornecedores, entre elas se destacam as universidades federais do Rio e do Rio Grande do Sul, a Universidade de São Paulo e a PUC do Rio, que possuem tradição nas áreas de petróleo e gás. "Foi uma experiência positiva. As empresas sabem que precisam se qualificar desde hoje ou estarão fora do contexto. Elas precisam se preparar", comenta a analista do Departamento de Instituições e Pesquisa da Finep, Cláudia Perasso.
A Petrobras é hoje uma das quatro maiores investidoras em pesquisa e desenvolvimento no mundo. Não é para menos. A empresa precisa desenvolver tecnologias e produtos especiais para trabalhar a profundidade de mais de 7.000 metros na Bacia de Santos. A petrolífera trabalha hoje com cerca de 130 instituições nacionais através de redes temáticas, pesquisando mais de 50 temas para o setor. "Nosso investimento em pesquisa e desenvolvimento é de US$ 1 bilhão por ano, valor cinco vezes maior do que investíamos no início da década". diz o gerente-executivo do Centro de Pesquisas da Petrobras, Carlos Tadeu Fraga.
O Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello (Cenpes), ligado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) é responsável pelos desenvolvimentos tecnológicos que levaram a Petrobras até as águas profundas. As principais linhas de pesquisa em elaboração desenvolvem tecnologias para avaliar reservas de óleo e gás, recuperação e análise de reservatórios, processamento e avaliação, engenharia de poço, elevação e escoamento de petróleo e gás.
No rasto da ampliação do Cenpes, que demandou investimentos da ordem de R$ 1,2 bilhão e foi concluída em novembro de 2010, diversas empresas estão construindo centros de pesquisa no Parque Tecnológico da UFRJ, que atualmente conta com 34 empresas instaladas, sendo 20 companhias nascentes, dez de grande porte e quatro de pequeno e médio porte. Quando o parque estiver totalmente implantado, dentro de cinco anos, a meta é elevar o número de empresas para 200, que devem empregar cerca de 5 mil pesquisadores.
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